Redigir

O Projeto

Em 1999, foi iniciado um projeto de extensão pela iniciativa dos alunos do Departamento de Jornalismo e Editoração da Escola de Comunicação e Artes com o objetivo de expandir a Universidade de São Paulo para além dos muros, uma vez que a premissa é colocar o cidadão na via de acesso às idéias, cultura e informação. Vários modelos foram pensados, mas ele acabou por ser, no início, um curso de redação para o vestibular.

No entanto, os interesses dos participantes foram se modificando conforme a renovação das gestões até possuir o foco atual, que seria uma perspectiva, solidária e humana, de transmitir para a população conhecimentos sobre as práticas sociais de comunicação (oral e escrita). Hoje, o curso do Redigir é voltado para a Gramática, literatura e interpretação de texto, como forma de emancipação social.

O Redigir possui diversas turmas, que tentam assim, abarcar o maior número de educandos possíveis, com turmas durante a semana, no horário noturno e aos sábados de manhã. As aulas são dadas nas salas da ECA, mais especificamente do CCA, e o curso todo tem a duração de um semestre, com aulas de 3 horas, uma vez por semana.

O empenho dos educandos e educadores é bastante claro, pois é possível observar uma longa trajetória dessas pessoas que, ao longo desses dezoito anos de projeto, estabelecem essa ponte de diálogo entre a Universidade de São Paulo e a sociedade. Os espaços devem ser ocupados, pois a sociedade é peça fundamental nesse processo que envolve a dialogia em seus variados níveis.

A proposta de intervenção tem como intenção pensar, repensar e produzir espaços e estruturas com condições, mesmo que simples, de serem ocupados a fim de criar novas possibilidades para deixar fluir os saberes, experimentar e praticar o conhecimento como forma de extensão para a sociedade envolvendo a comunidade em todo o seu desenvolvimento.

Com forte influência das ideias de Paulo Freire, de maneira consciente, o Redigir acredita que existe poder nas palavras. Vivemos numa sociedade altamente burocrática, saber utilizar a linguagem escrita formal, é uma forma de distinção social. O Redigir pode ser visto como uma forma de diminuir essa barreira linguística social, instigando o indivíduo a buscar seu próprio conhecimento. Não se quer aqui um pensamento ingênuo, mas pode ser a centelha que vai provocar a reflexão, a crítica, a condição de reelaborar o pensamento comum e se utilizar da linguagem como veículo de transformação social, neste sentido o domínio da palavra é poder.

Há dois sentidos de empoderamento mais empregados no Brasil: um se refere ao processo de mobilizações e práticas que objetivam promover e impulsionar grupos e comunidades na melhoria de suas condições de vida, aumentando sua autonomia; e o outro se refere a ações destinadas a promover a integração dos excluídos, carentes e demandatários de bens elementares à sobrevivência, serviços públicos etc. em sistemas geralmente precários, que não contribuem para organizá-los, pois os atendem individualmente através de projetos e ações de cunho assistencial (Gohn, 2004 apud Kleba; Wendausen, 2009).

Nós utilizamos aqui o empoderamento no sentido de autonomia, e nas ações que promovem a cidadania e igualdade de condições, desse ponto de vista o Redigir se preocupa com a formação e empoderamento dos indivíduos envolvidos. Buscam diminuir as distâncias entre uma educação pública precária, que na maioria das vezes não consegue sanar as dificuldades de leitura e escrita dos seus alunos, impedindo que possam acessar uma universidade pública de qualidade, uma maior qualificação para o trabalho, desenvolvimento pessoal e reflexão crítica sobre o seu próprio papel social.

O Documentário

Por ser um projeto tão interessante e tão próximo, geograficamente, dos alunos de educomunicação, achamos interessante a possibilidade de documentar o Redigir. Sendo assim, o curta produzido pode aparentar uma estranha familiaridade aos alunos do CCA, já que boa parte das filmagens se deram em salas e espaços que os alunos da ECA também utilizam na sua formação.
O vídeo se apresenta como um documentário participativo, de acordo com os tipos de documentários de Bil Nichols, pois consiste em entrevistas dos participantes do projeto (educadores e educandos), utilização de imagens disponíveis na internet para recuperar a história e poucas imagens das aulas sendo dadas para ilustrar. Em alguns momentos é mostrada a interação com os entrevistadores. Nossa intenção foi testemunhar o Projeto Redigir de maneira pela qual ele é representado por alguém que nele se engaja ativamente, e não por meio da observação discreta. Como diz Bill Nichols,

Se há verdade aí, é a verdade de uma forma de interação, que não existiria se não fosse pela câmera. Assim, ela é o oposto da premissa observativa, segundo o qual o que vemos é o que teríamos visto se estivéssemos lá no lugar da câmera. No documentário participativo, o que vemos é o que podemos ver apenas quando a câmera, ou o cineasta, está lá em nosso lugar. (NICHOLS, p. 155)

Entretanto, como diz o próprio autor, a identificação de um filme com um certo modo não precisa ser total. Apesar de aspectos do modo participativo serem predominantes, também há uma construção da narrativa graças à intercalação de pessoas entrevistadas para a criação de uma narrativa, característica do modo expositivo.